Uma foto,
uma história
O Arco de Pedras Secas
Após 14 longos anos sem visitar a ilha de Fernando de Noronha, tive o privilegio de retornar naquele lugar maravilhoso onde a minha paixão pelo mergulho e pela foto subaquática teve início. O período foi no final da pandemia em2021 e as restrições ainda eram muitas. Sendo assim, já sabíamos que o número de saídas de mergulho estava reduzido em comparação com outros períodos do ano.Eram poucos mergulhadores na ilha e isso certamente iria facilitar meu trabalho, pois o instrutor e a equipe da operação de mergulho teriam mais disponibilidade de me oferecer todo suporte que eu precisaria para realizar as fotos, sendo quase um mergulho particular. A ansiedade era enorme e o objetivo principal dessa viagem seria o de fazer um ensaio fotográfico bem diferente de outros que já tinham sido realizados anteriormente por vários fotógrafos, tendo como local alvo, a belíssima Pedras Secas, à qual eu ainda não conhecia. Fotos evidenciando o colorido dos corais, com cardumes eram sempre uma rotina e daí veio a ideia: porque não fazer algo que fugisse do comum? Algo fora “da caixa”,e busquei então propor algo inusitado aproveitando de toda beleza natural do lugar.Dentre as características marcantes de Pedras Secas podemos citar a sua estrutura rochosa única, composta de arcos, fendas e pequenas caverninhas, ou seja, o lugar ideal onde poderíamos fotografar as texturas, as formas das enormes rochas, usando apenas a iluminação natural, sem assim buscar o “colorido que já a rotina de sempre”. PedrasSecas situa-se no chamado “mar de fora” e possui uma profundidade média de 15 metros com ótima visibilidade durante a maior parte do ano. Dentre a vida marinha mais abundante podemos citar cardumes de cirurgiões, barracudas, lagostas, moreias, sargos e principalmente tubarões como lixa, bico fino e limão. Assim que cai na água e vi aquelas belíssimas formações, já passava um filme na minha cabeça de como poderiam ficar as fotos e procurei exatamente usar da beleza natural de suas rochas, o elemento principal do trabalho fotográfico. A correnteza já estava forte porque o período em que fomos já era final de temporada nos mergulhos nesse ponto, pois no mês de abril o mar geralmente fica mais agitado, e isso acabava atrapalhando o posicionamento do modelo na hora de realizar a foto.Para nossa sorte apareceram três tubarões nas imediações sendo o maior um grande limão que muito arisco não deixava se aproximar tanto. Fiquei simplesmente encantado com o que via e posso sim afirmar que Pedras Secas é certamente um dos locais mais belos e diferentes que já tive o prazer de conhecer e registrar.
As Aparências Enganam
Cada país tem seus segredos. Alguns mais e outros menos, mas todos têm. Conforme viajava eu tentava desvendar alguns desses segredos para que eu soubesse minimamente aonde estava me metendo. Em meu caminho estava o Iêmen e esse país parecia ser um local especialmente obscuro. Sentia que as informações tinham dificuldade de viajar para fora do país e mesmo em sua fronteira eu ainda não sabia quase nada do lugar em que estava prestes a entrar. Para não dizer que eu não sabia de nada, eu havia coletados algumas informações sobre o Iêmen, infelizmente nenhuma delas muito boa: haviam assassinado 5 turistas espanhóis dias antes de minha chegada, havia pontos de conflito no país, o islamismo mais radical da região estava ali e era o 2º pais com mais armas por habitante do mundo. Se eu fosse me basear nessa lista para chegar a alguma conclusão provavelmente seria que eu não duraria 1 dia nesse país. Logo que entrei no Iêmen descobri que essas informações estavam corretas, porém não faziam desse país um lugar ruim ou perigoso, pelo contrário, para minha surpresa foi um dos países que eu mais gostei e onde melhor fui recebido em toda a minha volta ao mundo. As armas estavam lá, bem como um enraizado islamismo, mas isso não fazia muita diferença, sempre que me lembro do Iêmen oque me vem à cabeça é a hospitalidade de seu povo. Simpatia e hospitalidade eram o forte daquela gente, me recebiam com festa nos vilarejos e preparavam banquetes nos lugares onde eu ia passar a noite. Era algo que eu não imaginava que pudesse acontecer. Algo tão improvável quanto ser parado na estrada para então ser escoltado por veículos do exército por cerca de 200 quilômetros. O local não parecia assim perigoso, mas como ordens são ordens, tive que pedalar acompanhado por um grupo de soldados e suas armas. Apesar dos rostos não muito amigáveis, bastava eu apontar minha câmera para eles para obter sorrisos. Atrás daquelas fardas estavam sujeitos muito simpáticos e como todo iemenita, hospitaleiros. Com um pouco de mímica e algumas palavras em inglês só precisei pedir uma vez para tirar uma foto com todos. Todos pararam o que estavam fazendo, alguns subiram no carro, outros ficaram ao lado da bicicleta, outros ainda fizeram cara de sérios e pronto, estava feita a foto do grupo que me protegeu de uma ameaça que nunca soube o que era. Quem vê a imagem sem saber da história até pensa que eu estava correndo algum risco naquele país, por isso é bom saber a história por trás de cada imagem.
Uma Manhã Especial
Em Expedição fotográfica, final de outono na Patagônia Argentina, iniciamos a aventura com um trekking de El Chalten até o Lago Torre, uns 12km, onde passamos a noite, foi dia de céu encoberto, nada de conseguir ver as torres. Pela manhã mais um trekking de 10km até o acampamento Poincenote, que fica na base do Fitz Roy, mais um dia de caminhada e nada de avistar o cume. Apesar de ainda ser outono, as temperaturas pareciam ser mais baixas que o normal, a sensação térmica era amenizada pelo trekking; carregar equipamentos montanha acima pode se dizer que aquece. Naquela tarde, o tempo fechou ainda mais, as temperaturas caíram, o que parecia que impossível aconteceu, a paisagem que estava toda laranja começou a ficar branca. De floco em floco, o cenário foi se modificando, fomos dormir achando que a manhã seguinte seria de mais um dia sem avistar a tão cobiçada torre do Fitz Roy e que tudo estaria branco de neve. Durante a noite o céu limpou, não nevou o suficiente para permanecer tudo branco. Acordamos por volta das 4h, manhã gelada, fria, mas sem neve, céu limpo e lá estava o cume do Fitz Roy, agora era esperar o momento no lugar certo, caminhamos alguns metros e já encontramos uma clareira às margens de um riacho, de onde se avistava as imponentes torres de granito do Cerro Chaltén. Aos poucos, os raios de luz laranja da manhã tingiam as rochas com as corres quentes.A sensação é indescritível, um misto de conquista, superação, dever cumprido. Talvez a imagem consiga terminar de descrever o que eu senti naquele amanhecer.
Pedalando na Água
Um bom planejamento é um dos pilares de uma viagem. O problema é quando surgem imprevistos e todo aquele planejamento inicial vai por água abaixo. No meu caso foi literalmente o que aconteceu. Tudo ia bem com meu planejamento no início da viagem, bem até demais. Havia feito todo o roteiro da viagem pensando em pedalar uma média de 70 km por dia, mas, como conseguia pedalar 100 km sem grandes dificuldades, aqueles quilômetros de lambuja viravam destinos adicionais e até descansos prolongados em algum lugar interessante. Tudo parecia perfeito até eu chegar à NovaZelândia, justamente um país que eu adicionei ao meu roteiro por estar bem adiantado em meu cronograma e ter uns dias para curtir nesse isolado país. Logo que cheguei à ilha norte da Nova Zelândia me surpreendi com a organização e segurança do local. Tudo parecia bom e bonito demais. Talvez tenha sido por isso que eu relaxei mais do deveria e logo em minha primeira pedalada pelo país percebi que havia perdido meu cartão de crédito. Esse pequeno pedaço de plástico era a ponte que separava os fáceis saques em moeda local da miséria.Sem ele eu estava quebrado até que chegasse um novo cartão. Me virei como pude durante 1 mês em Auckland até que chegasse um novo cartão do Brasil. Quando chegou meu cronograma já estava atrasado em 1 mês. Naquele momento eu não senti o impacto que isso teria sobre minha viagem. Segui pedalando sem me preocupar muito. Ainda fui para a Austrália e sem pressa até esqueci completamente desse atraso. Uma hora a conta chega, dizem. Neste caso específico estavam certos, chegou mesmo e nem demorou. Logo que pousei na Indonésia vi que não chegara na Ásia em seu melhor momento. Meu pedal ali começava simultaneamente com as monções. Eu ainda não sabia direito o que eram as monções, mas sabia que eu teria muita água pela frente. Hoje poderia definir monções como aquela nuvem preta que paira sobre a cabeça de alguém. Meu único problema foi que neste caso a cabeça era a minha. Não importava para onde eu ia, sabia que essa nuvem ia me seguir. Foi assim naIndonésia, Cingapura, Malásia, Tailândia, Camboja, Laos, Mianmar, Bangladesh eÍndia, onde esta foto foi tirada. Quando cheguei na Índia já havia caído muita, mas muita, chuva naquela parte do mundo. Tanta água que algumas cidades inteiras estavam submersas. Era até difícil de acreditar, as vezes eu via apenas um imenso lago com alguns telhados no meio dele, a cidade estava ali, mas debaixo d’água.Eu pedalava na esperança de chegar a algum lugar seco, onde não chovesse. Ainda que isso fosse só uma ilusão, praticamente uma cenoura na frente do burro, era uma grande motivação. Foi assim que resolvi cruzar o norte da Índia em direção ao Nepal e acabei encontrando estradas inteiras debaixo d’água. Pedalar na água era um desafio adicional à viagem. Meu desgaste físico era grande e o desgaste mecânico da bicicleta era maior ainda. Para minha sorte fazia calor, minhas bolsas eram á prova d’água e tudo o que começa chega a um fim. O Nepal, cuja fronteira estava próxima do local onde essa foto foi sacada, foi o último país onde as monções me castigaram. Quando voltei para a Índia semanas depois, a nuvem preta havia ido embora e começava a período oposto, dali para frente eu tinha quase só desertos pela frente. Depois de tanto torcer pelo fim das chuvas, começava o período mais árido de minha volta ao mundo.
Um Amigo na Fronteira
Esta talvez seja uma das fotos mais conhecidas da minha volta ao mundo de bicicleta. O mais curioso que apesar de conhecida e até imitada por outras pessoas, o sentido que ela ganhou não tem nada a ver com a intenção que eu tive ao saca-la.Naquele momento eu estava no início de minha volta ao mundo, ainda no primeiro continente, América do Sul. Havia atravessado o Brasil, Paraguai, Argentina, Chile e naquele momento estava na Bolívia, cruzando o Salar de Uyuni, um imenso platô coberto de uma grossa camada de sal. Na minha opinião um dos lugares mais bonitos e impressionantes do mundo. Tão impressionante que o simples fato de estar ali, dentro daquela imensidão branca, num dia frio e ensolarado, já é o suficiente para se sentir extremamente bem.Era assim que eu me sentia quando resolvi fazer esta imagem. Aproveitei que havia uma pessoa que sabia fotografar por perto e pedi para fazer a foto, algo raro em uma viagem solitária e ainda mais raro quando se está num deserto de sal. A ideia era fazer uma foto engraçada para mandar para meus amigos, algo que fosse totalmente contraditório, como relaxar deitado sobre um local perigoso. Poderia deitar no meio da pista, mas ali havia os trilhos de trem e foi ali onde eu deitei, até simulando aquelas imagens de filmes ou desenhos antigos nos quais a pessoa é amarrada sobre os trilhos.A imagem que saiu foi essa aí e eu gostei logo de cara. O curioso aconteceu quando eu publiquei essa imagem, logo de cara as pessoas associaram ela liberdade, tranquilidade e paz, que não era bem a mensagem que eu imaginava ao fazer a foto. Sempre achei curioso como alguém deitado sobe trilhos poderia passar uma imagem de tranquilidade, o trem pode passar a qualquer momento e acabar com essa paz.De qualquer forma, essa imagem ganhou vida própria e até hoje, 10 anos após o término da minha volta ao mundo eu recebo fotos de diversos viajantes no mesmo local ou em outros trilhos dizendo que se inspiraram nessa minha foto. Isso é algo extremante gratificante e mostra como mesmo saindo diferente do planejado esta foi uma foto que deu certo.
Caiaque vs Lava
Não sabíamos o que nos esperava quando fomos convidados a conhecer esse local na Big Island, no Havaí, que é o único lugar do planeta onde a lava escorre direto para o mar. Estávamos lá gravando um programa sobre caiaques para o canal Off e por causa da falta de água nas cachoeiras acabamos tendo alguns dias livres. Foi aí que uma pessoa local nos chamou para conhecer o vulcão Kilauea. O passeio era só para passar de barco ao longo da lava para conhecer o fenômeno. Chegamos às 5h da manhã pegar uma luz boa para fotografar a lava e no instante que chegamos o Pedro Oliva já colocou o caiaque na água porque aquela visão da lava caindo na água a dez metros de nós caindo n's era chocante e isso o motivou. Tudo era diferente; uma visão que não estávamos acostumados. Mesmo sem ter um briefing, comecei a clicar o Pedro na água se aproximando da lava. Foi uma ação de reflexo no momento. Logo depois, o sol já subido e a luz mudou completamente. Tivemos sorte de chegar ali na hora certa porque o sol nascente interfere positivamente na coloração da lava. Além disso, ver o trabalho do Pedro se esquivando e as ondas jogando o caiaque dele para perto da lava foi espetacular! Acabamos dando dando o título ao ensaio de de Caiaque vs Monstro da Lava à foto. A foto foi feita em 2012, mas consigo vender-la até hoje para publicações do mundo todo. De NatGeo a revistas chinesas me pedem essa foto até hoje porque foi um feito único e menos de um ano após nossa expedição a lava parou de jorrar e demorou bastante para voltar.
De Volta às Origens da Terra
Em 2010, fiz a minha primeira expedição fotográfica para a Adventure Sports Fair, com destino à província de Mendoza, na Argentina. Essa região é um verdadeiro paraíso, repleto de atrativos naturais únicos. Entre esses encantos, destaca-se a exótica La Payunia, uma área vulcânica com paisagens surreais, alternando entre cenários monocromáticos e multicoloridos. Caminhar por entre os labirintos esculpidos pela erosão natural é uma experiência única em alguns dos vulcões.La Payunia abriga uma das maiores concentrações de vulcões do mundo, somando mais de 800 e compondo o magnífico cinturão vulcânico dos Andes. Embora extintos há milênios, a desolação do local nos transporta de volta às origens da Terra. O solo, de predominância basáltica, se destaca por sua tonalidade escura e singular, com delicados tufos verdes de gramíneas pontuando a paisagem e alimentando os guanacos que habitam a região. À medida que caminhamos, podemos encontrar inúmeros piroclastos, pedras incandescentes lançadas por vulcões em erupção, que podem percorrer impressionantes distâncias de até 10 km da cratera. Algumas dessas rochas, após secarem, transformam-se na famosa pedra-pomes.O horizonte é dominado por vulcões de todas as dimensões, estendendo-se por quilômetros sem fim. Dentre eles, destaca-se o majestoso Cerro Payún - também conhecido como Payún Matrú. Explorar uma região tão enigmática como essa foi uma experiência que me fez sentir como se estivesse vivendo uma autêntica aventura de exploração, digna das cenas épicas dos filmes de Indiana Jones.Enfrentei um frio intenso, com ventos que desafiavam os mais corajosos. No entanto, o desconforto não era nada perto da determinação em capturar as melhores imagens daquelas paisagens ímpares. Tive a sorte de retornar ao local em 2013, e o encanto que senti na primeira visita permaneceu inalterado.La Payunia é um desses lugares extraordinários que nos deixam maravilhados com a grandiosidade da natureza; e as lembranças dessa jornada permanecem vivas em mim, como se fosse um tesouro inestimável. O desejo de explorar suas belezas e mistérios é algo que jamais esquecerei, e, quem sabe, em breve, novas aventuras me aguardem por lá.
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